PROPOSTA SURGIU APÓS PRESSÃO POPULAR
Aprovado projeto que
garante a autistas os mesmos direitos de pessoas com deficiência
Graças a um projeto
que surgiu da pressão popular, brasileiros com autismo vão ter os mesmos
direitos de pessoas com deficiência, para todos os efeitos legais. A garantia
foi conquistada na última quinta-feira (6/12) com a aprovação no plenário do
Senado do Projeto de Lei do Senado 168/11, que cria a Política Nacional de
Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista.
A lei está sendo
vista por pais e especialistas como uma Carta Magna dos autistas no Brasil. A
partir dela, essas pessoas vão, por exemplo, ter direito a tratamento
multidisciplinar e diagnóstico precoce. As famílias também foram contempladas:
além de acompanhamento psicológico, os pais ou responsáveis por pessoas com
autismo terão horário especial no trabalho.
“O tratamento
dessas pessoas requer tempo e muitos profissionais, por isso, esse horário
especial é necessário para adequar a rotina da família”, explica a
microempresária, Berenice de Piana, mãe de Dayan de Piana, de 18 anos. Ainda
segundo Berenice, que também é integrante do Mundo Azul — grupo de pais de
Itaboraí, no Rio de Janeiro, em defesa do autista — essa lei é muito importante
“porque tira essas pessoas do limbo”. Ela ressalta que antes da aprovação do
projeto - que agora só depende da sanção da presidenta, Dilma Rousseff, para
virar lei - os autistas não eram considerados nem pessoas normais, nem com
deficiência.
No Brasil, não há
estatísticas oficiais sobre o transtorno funcional, mas segundo a Adefa
(Associação em Defesa do Autista), uma das que ajudou na construção da
proposta, cerca de 2 milhões de brasileiros serão afetados pela nova lei.
Segundo a entidade, o autismo chega a ser mais comum entre crianças, que
doenças como Aids e diabetes. Para resolver o problema da falta de estatísticas
oficiais, o projeto cria um cadastro único dos autistas.
Além de articular
as ações de órgãos e serviços em todos os níveis de governo nas áreas de saúde,
educação, assistência social, trabalho, transporte e habitação, o texto
aprovado prevê punições para atitudes discriminatórias, como multa de três a 20
salários mínimos e sanções administrativas para o gestor escolar que recusar a
matrícula de aluno com autismo. A regra vale até mesmo quando não houver mais
vagas nas instituições de ensino. Em casos de "comprovada
necessidade", o estudante com o transtorno deve ser incluído nas classes
comuns de ensino regular. Se houver reincidência pelos professores ou outros
integrantes da escola, preservado o direito ao contraditório e a ampla defesa,
está prevista a perda de cargo por meio de processo administrativo.
Um dos grandes
desafios do Brasil em relação a pessoas com autismo é a falta de profissionais
capacitados para atuar na área, inclusive médicos. A esperança dos pais é que
como o projeto estabelece a criação de centros de tratamento multidisciplinar
em todo o país, force essa capacitação. “O período mais importante para
tratamento é 0 até os 5 anos, mas a gente fica perambulando pelos consultórios.
Quando a gente consegue o diagnóstico, já se perdeu um tempo precioso. Como o
problema não tem cura, quanto mais cedo a estimulação, mais chance essas
pessoas têm de desenvolvimento”, alerta Berenice.
Durante a discussão
da proposta chegou a ser apresentada uma emenda que previa penas para as
práticas de castigo corporal, ofensa psicológica, tratamento cruel ou
degradante à criança ou adolescente com deficiência ou com autismo como forma
de correção, disciplina ou outro pretexto. Mas o trecho foi retirado do texto
porque o relator da proposta, senador Wellington Dias (PT-PI), argumentou que
as penas previstas no Código Penal são mais rígidas que as propostas no
projeto.
“Para nós, pais que
temos filhos com autismo, é um marco que encerra um período de pessoas
abandonadas, que viviam enclausuradas em suas casas. A partir da aprovação [do
projeto], a história de sofrimento e dor acabou.” comemorou o militar Ulisses
da Costa Baptista, um dos fundadores da organização não governamental Mão
Amiga, do Rio de Janeiro, e pai de Rafael, de 16 anos. Ele ressaltou que a
mobilização dos pais foi fundamental para que a lei fosse aprovada em dois
anos, tempo considerado rápido para a tramitação de projetos no Congresso. “ Os
pais agora tem um instrumento legal e fazer esses direitos saírem do papel só
depende agora que eles continuem engajados”, disse.
A pedido Ulisses,
em agosto de 2007, a Defensoria Pública Geral do Estado do Rio entrou com uma
representação na OEA (Organização dos Estados Americanos) contra o Brasil. O
documento, que até hoje está em tramitação, pede a condenação do país por não
oferecer condições adequadas de atendimento aos autistas, como tratamentos
avançados, existentes, por exemplo, nos Estados Unidos.
O autismo, definido
em 1943 pelo psiquiatra austríaco, Leo Kanner, é um transtorno que compromete a
capacidade de comunicação e desenvolvimento de relações sociais do indivíduo,
que passa a se comportar de modo compulsivo e ritualista. É diferente do
retardo mental ou da lesão cerebral, embora algumas crianças com autismo também
tenham essas patologias. Os especialistas ainda não sabem explicar a grave
dificuldade de relacionamento dessas pessoas.
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