Blog Histórias das ruas
http://www.historiasdasruas.com/Esse blog é sensacional, conta histórias de pessoas da rua. Vale a pena conhecer esse projeto. O blog também está concorrendo ao prêmio de melhor blog em português. Você vai conhecer muitas histórias de vida.
Texto do Blog Histórias das ruas
Dois pais, duas mães.
Duas semanas sem publicar histórias novas por conta de mudanças e novos trabalhos que me tiraram um pouco o tempo para poder sair nas ruas e conversar com os moradores. Porem, o novo trabalho rendeu uma boa história.
Andando pelo mesmo caminho rotineiro, próximo a estação Tiradentes de Metro da cidade de São Paulo, pude observar uma senhora que todos os dias fica no mesmo lugar com suas coisas. Cabelos brancos, sempre muito bem arrumada em vestimentas e com um semblante aborrecido, é ela que vai nos contar hoje a sua história.
No começo um pouco relutante não querendo nem mesmo dizer o seu nome e no final agradecendo por eu ter parado para conversar com ela. Vale a pena ler!
Andando pelo mesmo caminho rotineiro, próximo a estação Tiradentes de Metro da cidade de São Paulo, pude observar uma senhora que todos os dias fica no mesmo lugar com suas coisas. Cabelos brancos, sempre muito bem arrumada em vestimentas e com um semblante aborrecido, é ela que vai nos contar hoje a sua história.
No começo um pouco relutante não querendo nem mesmo dizer o seu nome e no final agradecendo por eu ter parado para conversar com ela. Vale a pena ler!
“Chamo-me Berenice Gonçalves e tenho cinquenta e oito anos. Nasci em uma cidade no interior de Pernambuco e lá vivi trinta e quatro anos de minha vida. Tinha uma vida normal, trabalhava como empregada domestica tomando conta de uma casa e três crianças de uma família muito rica da cidade. Tinha marido e minha própria casa. Estava construindo a minha família, como qualquer mulher normal. A minha história começa a ficar complicada desde quando eu era criança. Quando eu tinha doze anos, meu pai veio a falecer e com a morte dele minha mãe me contou que o meu pai, na verdade, não era o meu pai e sim o meu tio e que ela também não era a minha mãe e sim a minha tia. Meus pais quando me tiveram não tinham condição nenhuma de me sustentar e me criar. Com dois anos de idade eles me deram aos meus tios, irmão do meu pai, para que eles pudessem me dar o que era necessário. Fui saber disso só quando o meu pai de criação veio a falecer. Meus pais biológicos que até então eu conhecia como tios, eram bem ausentes, tínhamos pouco contato.
Com toda essa história, depois de um tempo, consegui entender o lado dos meus pais biológicos e comecei a me aproximar mais deles. Alguns meses se passaram depois da morte do meu pai e minha mãe (criação) veio a falecer também.
Mesmo com a morte dos meus pais continuei morando na mesma cidade e após alguns meses eu terminei o meu casamento. Meu ex-marido bebia muito e não possuía mais nenhum respeito por mim. Divorciada, sem lugar para morar, um dos meus irmãos mais velho mandou dinheiro para eu me mudar para a cidade de São Paulo e viver junto com a minha mãe (biológica). Como não tinha outra opção, eu aceitei e vim morar com ela na capital.
Ao chegar à cidade já comecei a trabalhar como domestica em uma casa de família, como já fazia em Pernambuco. Fiquei trabalhando na mesma casa por quatro anos. Dois anos após eu ter me mudado para São Paulo minha mãe biológica faleceu, mas como eu já tinha um emprego e conseguia me sustentar sozinha, continuei morando na mesma casa. Comecei a ficar muito sozinha e entrei em uma grande depressão. Como estava sem motivação para nada, perdi meu emprego. Perder o emprego foi um dos motivos mais fortes que tive para vir parar nas ruas. Eu não tinha e até hoje não tenho muita amizade com os meus irmãos, nunca nos demos muito bem, pensamentos muito diferentes e crescemos muito distantes uns dos outros. Eles não podiam me ajudar e com três meses de aluguel atrasado eu fui despejada da casa onde vivia. Nesse momento, tentei procurar ajudar na igreja onde frequentava e uma de minhas amigas me estendeu a mão e deixou eu ficar por um tempo na casa dela até eu retomar a minha vida, porem, comecei a ter muitos problemas com o marido dela e para não causar um problema maior ou até mesmo uma briga resolvi eu mesma sair de lá e fui para as ruas. A minha vinda as ruas foi natural, comecei a passar uma semana e quando vi já estava quase há um ano dormindo cada dia em um lugar diferente. Vivo assim há quatro anos.”
Com toda essa história, depois de um tempo, consegui entender o lado dos meus pais biológicos e comecei a me aproximar mais deles. Alguns meses se passaram depois da morte do meu pai e minha mãe (criação) veio a falecer também.
Mesmo com a morte dos meus pais continuei morando na mesma cidade e após alguns meses eu terminei o meu casamento. Meu ex-marido bebia muito e não possuía mais nenhum respeito por mim. Divorciada, sem lugar para morar, um dos meus irmãos mais velho mandou dinheiro para eu me mudar para a cidade de São Paulo e viver junto com a minha mãe (biológica). Como não tinha outra opção, eu aceitei e vim morar com ela na capital.
Ao chegar à cidade já comecei a trabalhar como domestica em uma casa de família, como já fazia em Pernambuco. Fiquei trabalhando na mesma casa por quatro anos. Dois anos após eu ter me mudado para São Paulo minha mãe biológica faleceu, mas como eu já tinha um emprego e conseguia me sustentar sozinha, continuei morando na mesma casa. Comecei a ficar muito sozinha e entrei em uma grande depressão. Como estava sem motivação para nada, perdi meu emprego. Perder o emprego foi um dos motivos mais fortes que tive para vir parar nas ruas. Eu não tinha e até hoje não tenho muita amizade com os meus irmãos, nunca nos demos muito bem, pensamentos muito diferentes e crescemos muito distantes uns dos outros. Eles não podiam me ajudar e com três meses de aluguel atrasado eu fui despejada da casa onde vivia. Nesse momento, tentei procurar ajudar na igreja onde frequentava e uma de minhas amigas me estendeu a mão e deixou eu ficar por um tempo na casa dela até eu retomar a minha vida, porem, comecei a ter muitos problemas com o marido dela e para não causar um problema maior ou até mesmo uma briga resolvi eu mesma sair de lá e fui para as ruas. A minha vinda as ruas foi natural, comecei a passar uma semana e quando vi já estava quase há um ano dormindo cada dia em um lugar diferente. Vivo assim há quatro anos.”
Uma história no mínimo confusa marcada por grande sofrimento e revelações, Berenice esclareceu um pouco mais de sua vida respondendo alguma de minhas perguntas.·.
Nesse tempo (quatro anos) em que a senhora está vivendo nas ruas, você já tentou procurar alguém de sua família?
- “Não, nunca mais tive contato com ninguém. Como já disse, eu e meus irmãos somos totalmente diferentes, isso dificulta demais a nossa relação.”
- “Não, nunca mais tive contato com ninguém. Como já disse, eu e meus irmãos somos totalmente diferentes, isso dificulta demais a nossa relação.”
Você se sente abandonada?
- “Não diria abandonada, e sim triste. Depois de um tempo vivendo na rua, você perde a esperança de voltar a ser a pessoa que um dia você já foi.”
- “Não diria abandonada, e sim triste. Depois de um tempo vivendo na rua, você perde a esperança de voltar a ser a pessoa que um dia você já foi.”
A senhora perdeu a sua?
- “Não (risos)... Ainda tenho esperança de sair das ruas e poder pelo menos ter uma casa para eu cuidar.”.
- “Não (risos)... Ainda tenho esperança de sair das ruas e poder pelo menos ter uma casa para eu cuidar.”.
Qual é a motivação ou ajuda que falta para a senhora começar a retomar a sua vida?
- “Depois que você vive por um tempo nas ruas, é muito difícil alguém confiar em você, ninguém confia em mim. Nunca usei drogas e sempre fui uma pessoa muito reservada. Mesmo dizendo que já trabalhei por anos em casa de família, ninguém acredita na minha palavra.”
- “Depois que você vive por um tempo nas ruas, é muito difícil alguém confiar em você, ninguém confia em mim. Nunca usei drogas e sempre fui uma pessoa muito reservada. Mesmo dizendo que já trabalhei por anos em casa de família, ninguém acredita na minha palavra.”
Você já sofreu alguma agressão nas ruas?
- “Sim, a pouco menos de um ano eu estava dormindo e um homem, morador de rua também, tentou me roubar e começou a me bater quando eu estava deitada em uma madrugada. Algumas pessoas viram as agressões, mas ninguém fez nada para ajudar.”
- “Sim, a pouco menos de um ano eu estava dormindo e um homem, morador de rua também, tentou me roubar e começou a me bater quando eu estava deitada em uma madrugada. Algumas pessoas viram as agressões, mas ninguém fez nada para ajudar.”
Como é viver na rua para a senhora?
- “A rua é perigosa. Não dormimos! Eu levo comigo uma teoria, para os homens, a rua é mais fácil de viver, para mulher e principalmente de mais idade como eu, é muito mais difícil. Temos a questão de higiene que é muito complicada nas ruas.”
- “A rua é perigosa. Não dormimos! Eu levo comigo uma teoria, para os homens, a rua é mais fácil de viver, para mulher e principalmente de mais idade como eu, é muito mais difícil. Temos a questão de higiene que é muito complicada nas ruas.”
Você não teve nenhum filho?
- “Não, infelizmente tenho um problema que não consigo engravidar.”
- “Não, infelizmente tenho um problema que não consigo engravidar.”
Desses quatros anos que você esta vivendo nas ruas, possui alguma lembrança boa?
- “Sim. Tenho boas recordações de todas as pessoas que sentam ao meu lado para conversar.”
- “Sim. Tenho boas recordações de todas as pessoas que sentam ao meu lado para conversar.”
Tem algum sonho?
- “Sair das ruas!”
- “Sair das ruas!”
O que é felicidade para você?
- “Felicidade para mim é poder ter uma família e conviver bem com todos, ter uma casa e um trabalho.”
- “Felicidade para mim é poder ter uma família e conviver bem com todos, ter uma casa e um trabalho.”
Você se considera feliz?
- “Na rua não existe felicidade.”
- “Na rua não existe felicidade.”
Gostaria de passar alguma mensagem para as pessoas que vão estar lendo a sua história?
- “Nunca abandone a sua família, brigar é normal mas se entendam depois, procure entender as pessoas e acima de tudo, nunca perca a esperança!”
- “Nunca abandone a sua família, brigar é normal mas se entendam depois, procure entender as pessoas e acima de tudo, nunca perca a esperança!”
Escrito por: Henrique Rangel
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